quinta-feira, 22 de abril de 2010

A evolução tática



A tática é, provavelmente, o elemento mais importante do futebol. Clubes pagam salários astronômicos para os profissionais que cuidam da tática, os técnicos. Alguns times têm tática fixa como o Barcelona, e outros a mudam de acordo com o adversário, como a Costa do Marfim.

O que interessa é que, de fato, seria impossível criar um time competitivo com jogadores se mexendo em campo, sem cuidar de marcação e trocando constantemente a posição.

Alguns dizem que a Holanda de 1974, e o Brasil de 1970 não tinham tática. Falam que os jogadores se movimentavam em campo sem preocupação. Tostão, em sua coluna, disse que isso era mentira, que Zagallo estabeleceu posicionamento sim.

E a Holanda, é simples: é verdade que os jogadores trocavam de posição sempre, mas cuidava muito da marcação. Ora por pressão, ora esperando o adversário, e se um lateral avançasse, um volante ia cobri-lo.

O que é verdade é que as táticas mudam muito desde a existência do futebol, e podemos destacar que os times, pelo menos no papel, eram mais ofensivos.

Viajamos ao tempo para 1930. Mais precisamente na Copa do Mundo do Uruguai. Todas, absolutamente todas as equipes participantes usaram o esquema tático 2-3-5. Dois zagueiros, três meias, e cinco atacantes.

Isso resultava em muitos gols feitos, e muitos sofridos. A média de gols foi de 3,88 gols, mas a Argentina, vice-campeã, tomou 9 gols em 5 jogos. Um pequeno exemplo.

Voltando ao assunto principal, este esquema privilegiava o ataque, como é óbvio. Normalmente, ficavam dois zagueiros que não passavam do meio campo, um jogador de meio que ia e voltava para marcar, um para armar, e outro para chegar de surpresa; já no ataque, ficavam 2 pontas, dois segundos atacantes que as vezes também eram pontas, e um jogador que ficava parado na área.

Este esquema perdurou também na Copa de 1934, em que todas as seleções usaram o 2-3-5.

Também em 1938, mas aí as coisas começaram a mudar quando os times ingleses adotaram em massa o "WM", em meados dos anos 1940; o esquema foi criado em 1930, por Herbert Chapman, que o implantou no Arsenal, mas se popularizou com a seleção inglesa.

Porque o nome WM? É que, como você vê abaixo, o posicionamento dos jogadores formavam as letras W e M. Ou em números, um 3-2-5, que favorecia o ataque igualmente, porém revolucionava pelo "grande" poderio defensivo. Explico: os três zagueiros ficavam em linha, um jogador de meio campo era um volante que não subia ao ataque, e o outro subia e descia. No ataque, ficavam dois pontas, um isolado, e dois atacantes que voltavam para marcar, função que exercem, hoje, Tévez e às vezes Rooney. E que também exerceu Hidegkuti...



...uma das estrelas da máquina húngara que assombrava o mundo nos anos 1950. No papel, o esquema era o 2-3-5, mas em campo tudo mudava. A defesa era simplesmente horrível, pois os jogadores defensivos eram muito ruins. Tomou 10 gols em 5 jogos. Mas fez 27 gols em 5 jogos, média de quase 6 gols por jogo.

Zakarias era um bom jogador no meio de campo. Era muito defensivo, mas era para equlibrar um pouco. E no meio, tinha Boszik, um dos maiores da história. Defendia muito bem, atacava muito bem, e tinha um passe espetacular. Hidegkuti era o jogador mais tático da seleção "magia magiar". Ele era um atacante, mas como dito anteriormente, voltava muito para o meio campo. Tinha muito bom passe e criava espetaculares chances para Puskas, que ficava no lado direito do campo, com um petardo no pé direito. Kocsis era um exímio cabeceador, que ficava isolado na área.

Talvez por ignorarem a defesa, essa seleção não ganhou a final da Copa contra os alemães, mas participou da primeira revolução tática da história das copas.

Em 1958, foi a vez de a primeira seleção vencer a copa sem usar o 2-3-5. Agora a moda era o 4-2-4, com dois laterais e quatro atacantes. Isso dava mais valor à defesa, embora ainda continuasse muito ofensivo, e a copa teve boa média de gols. A diferença era Zagallo, que era ponta, entretanto recuava para marcar, como Jorge Henrique faz no Corinthians.

1962, a seleção canarinho venceu com o mesmo esquema.

Em 1966, a seleção inglesa conseguiu uma façanha. Usando o 4-2-4, embora na prática não fosse bem assim. Ball era um ponta, mas voltava para marcar, como hoje o faz Ribéry ou Jorge Henrique. Stiles era meio campo, e era muito violento, porém isso assustava os adversários. Charlton era volante, mas tinha um passe excelente, e fazia muitos gols. Mas cumpria bem o papel defensivo. Um craque. E os atacantes não eram bem atacantes: voltavam bastante para marcar. Com isso, a prioridade era defensiva. Isso resultou em menos de 1 gol sofrido por partida, e média de apenas 1,80 gol por jogo.

Em 1970, a seleção brasileira utilizava um esquema com dois zagueiros, dois laterais, um volante, dois armadores e três atacantes. Um 4-1-2-3. Gérson armava o jogo todo, Rivellino ajudava pela esquerda, embora chutasse mais que seu companheiro de meio campo. Clodoaldo era um marcador. Pelé era como um atacante. A tática ainda privilegiava o ataque, ao contrário de 1966.

Em 1974, ocorre provavelmente a maior revolução tática da história. A Holanda eu não me atrevo a dizer sua tática. Os jogadores simplesmente jogavam em todas as posições. Cruyff era atacante, volante, meia, lateral, zagueiro, ponta... Assim como os outros holandeses. Era o carrossel holandês. Podíamos dizer que era por vezes um 8-0-1, e por vezes um 1-8-1. Defendia com muitos jogadores, e atacava com muitos. É verdade que poucos times conseguiram usar esse esquema com a magia que a Holanda fez, mas muitos times tentaram copiar. Nenhum, no entanto, com a eficiência da laranja mecânica. Por causa dessa seleção, muitos jogadores que participaram dela até hoje têm posições confundidas. Cruyff para uns era meia, para outros atacante. Neeskens era meia para alguns e atacante para certas pessoas. Rep era ou ponta, ou volante.

Na copa de 1978, a seleção vencedora jogava num 4-3-3, embora não parecesse. Era defensiva.

Em 1982, o Brasil, que julgo o verdadeiro campeão, jogava num 4-4-2 verdadeiro, embora os jogadores, a exemplo da Holanda de 1974, trocassem constantemente de posição. Como atuava sem pontas, isso de fato ajudou a declará-los mortos na tática das equipes - hoje, poucas equipes usam pontas.

Depois, as equipes vencedoras sempre usaram o 4-4-2 ou alguma variação do esquema, como o 3-5-2, que é praticamente o mesmo, no entanto, os laterais avançam mais. Exceção feita a frança de 1998, que atuou num 4-5-1.

De fato, vemos que a evolução tática foi um processo contínuo ao longo do tempo, com pequenas, no entanto eficientes alterações na tática que marcaram história. Hidegkuti em 1954, quando o técnico mandou ele recuar é um exemplo. Zagallo, em 1958, que por conta própria voltou para marcar, ajudou a diminuir o poder dos pontas.

Esses pontas, que foram sem dúvida a maior mudança tática da história. Se em 1930 um time chegava a ter quatro jogadores que jogavam no lado do campo, hoje praticamente não há. O Barcelona vem ajudando a ressucitar os pontas, com Iniesta ou Pedro pela esquerda, Messi pela direita e Ibrahimovic na frente.

Isso é importante para ver que a tática é muito importante no futebol. Os técnicos, ao meu ver, não são sobrevalorizados, salvos pequenas exceções de técnicos ruins que ganham salários astronômicos.

Até mais, e me desculpem por ter feito um texto desse tamanho!

1 comentários:

Anônimo disse...

Texto fantástico, que sintetiza precisamente as constantes evoluções táticas e seu impacto sobre a forma de jogar das seleções. Tá de parabéns!

21 de julho de 2012 às 19:41

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